segunda-feira, 21 de junho de 2010

Oração por Marilyn Monroe


ORAÇÃO POR MARILYN MONROE


Ernesto Cardenal


Tradução de Antonio Miranda



Senhor

recebe a esta moça conhecida em toda parte pelo nome de Marilyn Monroe

mesmo que esse não fosse seu verdadeiro nome

(mas Tu conheces seu verdadeiro nome, o da pequena órfã violada aos 9 anos

e da empregadinha de loja que aos 16 anos já queria se matar)

e que agora se apresenta diante de Ti sem maquiagem

sem um Agente de Imprensa

sem fotógrafos e sem dar autógrafos

solitária como um astronauta diante da noite espacial.

Ela sonhou quando menina que estava nua numa Igreja (pela versão do Time)

ante uma multidão prostrada, com as cabeças no chão

e tinha de caminhar pé ante pé para não pisar nas cabeças.

Tu conheces nossos sonhos melhor que os psiquiatras –Igreja, casa, cova são a segurança do seio materno

mas também algo mais que isso...

As cabeças são os admiradores, é claro

(a massa de cabeças na escuridão debaixo do facho de luz).

Mas o templo não são os estúdios da 20th Century Fox.

O templo – de mármore e ouro – é o templo de seu corpo em que está o Filho do Homem com látego na mão

expulsando os mercadores da 20th Century Fox

que fizeram de Tua casa de oração um covil de ladrões.

Senhor

neste mundo contaminado de pecados e radioatividade

Tu não culparás tão-somente a empregadinha da loja.

Que como toda empregada de loja sonhou ser estrela de cinema.

E seu sonho tornou-se realidade (mas com a realidade do technicolor).

Ela não fez senão atuar conforme o script que lhe demos

- O de nossas próprias vidas – E era um script absurdo.

Perdoa Senhor e perdoa-nos a todos pela nossa 20th Century Fox

por esta Colossal Superprodução em que todos nós trabalhamos.

Ela tinha fome de amor e lhe demos tranqüilizantes,

para a tristeza de não ser santos, recomendamos-lhe a Psicanálise.

Lembra-te Senhor de seu crescente pavor à câmera

e o ódio à maquiagem – insistindo em maquiar-se em cada cena –e como foi se tornando maior o horror

e maior a impontualidade nos estúdios.

Como toda empregada de loja

sonhou tornar-se estrela de cinema.

E sua vida foi irreal como um sonho que um psiquiatra interpreta e arquiva.

Seus romances foram um beijo com os olhos fechados

que quando se abrem

descobre-se que foi sob os refletores

e apagam os refletores!

e desmontam as paredes do aposento (era um set cinematográfico)

enquanto o Diretor se afasta com sua caderneta porque a cena já foi filmada.

Ou uma viagem de iate, um beijo em Cingapura, um baile e no Rio

uma recepção na mansão do Duque e da Duquesa de Windsor

vistos na TV de um apartamento miserável.

O filme terminou sem o beijo final.

Foi achada morta em sua cama com a mão no telefone.

E os detetives não souberam a quem ela ia chamar.

Foi como alguém que discou o número da única voz amiga

e ouviu apenas a voz de uma gravação que diz: WRONG NUMBER.

Ou como alguém que ferido pelos gangsters

estende a mão a um telefone desligado.

Senhor

quem quer que tenha sido quem ela queria chamar

e não chamou (e talvez fosse ninguém

ou era Alguém cujo número não está na Lista de Los Angeles)

atende Tu ao telefone!



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